O pastor Paulo Rogério é um dos maiores produtores de queijo da Serra da Estrela DOP. Mas, apesar do passar dos anos, não consegue esquecer os incêndios de 2017 que lhe levaram 200 ovelhas. Conta como continua a lutar contra aquilo que considera uma injustiça que foi a ausência de apoios quer da Câmara Municipal de Oliveira do Hospital, quer do poder central. Uma carência que voltou a sentir com a COVID-19, numa altura em que começava a levantar a cabeça e a marca “Renascer das cinzas” que criou após os incêndios começava a dar alguns frutos.
“Tenho 280 ovelhas, todas bordaleiras. Mas estou a pensar, até ao final do ano, em acabar com a actividade ou introduzir outras raças que produzem mais leite e são muito mais rentáveis do que produzir queijo DOP. Não temos apoios palpáveis. Da Câmara temos festas, mas nada de verdadeiramente significativo e depois a diferença do preço do litro do leite de uma bordaleira para uma das outras raças é de 15 cêntimos. Isto para não falar da concorrência descarada do leite espanhol”, conta, sem conseguir disfarçar alguma constrição.
Aos 49 anos, Paulo Rogério vai tentando explicar o que diz ser incompreensível nestas políticas dos apoios municipais e governamentais. Começa logo por dizer que os políticos mentiram quando disseram que os projectos de recuperação dos prejuízos causados pêlos incêndios seriam apoiados a 85 por cento. “O meu projecto era de 108 mil euros, mas eu tinha de comparticipar com 66 mil euros, logo o que nos prometeram era mentira”, continua. “Se soubesse o que sei hoje tinha fugido com as ovelhas e deixava arder a casa e a queijaria. Assim era ajudado. Como fiquei cá a defender isto, morreram-me 150 ovelhas e 50 jovens e não recebi nada. Não se entende”, lamenta.
Com a pandemia continuou aquilo que classifica de “política descabida, tanto local, como a nível do poder central”. “Isto é de loucos. Repare: todos os pequenos produtores que tinham ovelhas e queijarias não receberam apoios. Quem tinha ovelhas e vendia o leite foi apoiado, tal como as queijarias que compram o leite. Só aqui no concelho de Oliveira do Hospital somos quatro produtores que não recebemos um cêntimo”, lamenta. Sublinhando que entre estas crises já teve de se desfazer de terrenos para manter a cabeça fora de água. “E depois da Câmara Municipal os apoios foram zero e ainda me complicaram ainda a vida quando tratei da construção de abrigos e dos muros para combater a erosão dos solos. Devo ser um oliveirense de segunda”, sublinha.
O apoio de 150 borregas de quatro meses que chegou pela mão da Associação Nacional Criadores de Ovinos Serra da Estrela (ANCOSE), graças à boa vontade de particulares e do ministério da Agricultura, também não foi suficiente para superar o problema. Aqueles animais só agora começam a produzir leite e, segundo Paulo Rogério, a cerca de 50 por cento de uma ovelha habituada e criada naqueles terrenos. “Tem de existir um aperfeiçoamento genético e isso demora no mínimo dez anos”, conta, referindo mais uma vez que, se calhar, está na altura de mudar de vida. “Não é por acaso que a idade dos produtores tem aumentado e as cabeças de gado autóctones tem diminuído ao longo dos anos para valores alarmantes. Mas ninguém olha para nós, ninguém quer saber. Um dia será demasiado tarde”, remata.