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Beira Alta… Autor: António Moura

Há lugares com um poder mágico extraordinário e onde o tempo, espantosamente, tem tempo para nós. Neles, o que antes nos absorvia e consumia num fogo contínuo vai-se extinguindo quase sem darmos conta. É algo libertador, uma metamorfose imperceptível e relaxante. Trump, Bolsonaro, o racismo, a Covid-19, o quotidiano às vezes irritante, etc, quase tudo desaparece perante a força desses lugares e é substituído por um outro mundo. Pinhel, Figueira de Castelo Rodrigo e Vila Nova de Foz Côa possuem essa capacidade rara de nos capturar totalmente e transportar para outra dimensão, a da natureza através de algumas das suas mais formidáveis manifestações. Uma natureza (ainda) intocada, como o vale por onde o rio Côa corre rumo ao Douro, numa viagem que começa lá para os lados da Serra da Malcata e termina mais de cem quilómetros depois no rio Douro. O que o terá levado para norte e não para sul ou para oeste como os grandes rios de Portugal e de Espanha? O Côa viaja como que em contramão, imparável, entre vales profundos e penhascos brutais, umas vezes tranquilo, outras apressado. Que rio! Que paisagem a que ele atravessa! Cidadelhe encontra-se pousada num alto sobre a margem esquerda do Côa. Gostava de ter nascido numa aldeia assim, dividida entre “o povo de cima” e “o povo de baixo”, este mais antigo, um aglomerado de velhas casas térreas e de pedra, uma igreja com a torre sineira construída à parte e ruas, por vezes, emolduradas por flores que, com o seu colorido vivo, rompem com o cinzento dominante e o castanho avermelhado dos telhados. Cidadelhe descobriu o turismo (ou terá sido este que a descobriu e se enamorou dela?), o que está patente nas casas restauradas e em restauro para acolher forasteiros. Será o futuro capaz de respeitar a identidade e a história? Cidadelhe é do melhor que a Beira Alta tem para oferecer, com a sua rudeza acolhedora, um encantador poema de pedra, é o Portugal abandonado e que procura resistir abrindo-se ao mundo. Para norte, já no Douro vinhateiro, fica Almendra com a sua antiga estação de caminho-de-ferro. Esta encontra-se abandonada desde que a linha do Douro foi amputada no Pocinho, e os 12 quilómetros de estrada que a ligam à povoação homónima merecem bem uma visita. Quanto mais não seja pelas vistas soberbas do grande rio e dos vinhedos que descem (ou sobem?…) pelas suas margens. De volta para sul, rumo a Figueira de Castelo Rodrigo, a Serra da Marofa, com os seus quase mil metros de altitude, várias antenas de telecomunicações e um cristo-rei de pedra, destaca-se no vasto planalto beirão. A aldeia histórica de Castelo Rodrigo ergue-se ali perto e no sopé desta situa-se o Convento de Santa Maria de Aguiar, do século XII, e uma tranquila e muito agradável unidade hoteleira. Mais para sul ficam a Barragem de Santa Maria de Aguiar, Almofala e as impressionantes arribas do Rio Águeda, vigiadas por grifos, águias e abutres… A Beira Alta na transição para o Douro é um território literalmente espectacular e retemperador.

Autor: António Moura, jornalista

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