Um dos meus propósitos quando escrevo esta crónica também é dar a conhecer alguns fotógrafos que de alguma forma se destacam ou destacaram sem porém querer entrar nos incontornáveis e explicar o porquê da relevância dos seus trabalhos. Começo por vos dar a conhecer Marc Garanger.
Nasceu em 1935 em Ézy-sur-Eure
A sua carreira de fotógrafo começou quando cumpria o serviço Militar, que terminou na Argélia em 1960.
Nesta época o Movimento de Independência da Argélia era particularmente activo, e o exército francês recorria a todos os meios ao seu dispor para suprimir a sua actividade.
A fim de obter um maior controlo sobre a população argelina, o Estado francês distribuiu documentos de identificação pessoal franceses pelos argelinos.
O Exército francês levou a cabo uma operação de ataque nas aldeias de Montanha, o Exército Francês decidiu destruir as aldeias e transferir as populações para outras aldeias na planície, esperando assim desmembrar a Resistência Argelina que se refugiava naquela região inóspita.
Marc Garanger foi o incumbido de fotografar os cidadãos locais a fim de estes terem documentos franceses. E fê-lo recorrendo a uma parede branca como fundo neutro. Garanger fazia quase 200 retratos por dia. A maioria mulheres (berberes ou muçulmanas) jamais tinha visto um europeu, e pela primeira vez e viram-se obrigadas a destapar os seus rostos em público. Sentiram-se humilhadas. O exército francês usou a câmera fotográfica de Marc Garanger como arma para humilhar culturalmente a população argelina. O próprio Garanger disse o seguinte em relação às suas fotografias:
“Consegui sentir a resistência silenciosa mas intensa da proximidade íntima. E quero que as minhas fotografias sejam o testemunho disso. Todas as fotografias que tirei durante os dois anos que estive na Argélia devem constituir um protesto contra os terrores a que assisti. (…) As mulheres não tinham escolha ou opção no assunto. A sua única forma de protesto era através dos seus olhares”
Garanger publicou uma selecção dessas imagens em 1982, num livro chamado de “Mulheres Argelinas”.
Um artigo da revista Time, datado de 23 de Abril de 2013 e escrito por Carole Naggar, estabelece um paralelo entre o trauma da Guerra da Argélia para a França e o da Guerra do Vietname para os EUA. Porém a autora refere que ao invés dos EUA, são poucos os registos fotográficos existentes do conflito na Argélia e esta situação transforma os registos de Garanger num espólio extremamente valioso, porque são alguns dos poucos registos existentes desse período. Carole Naggar cita Garanger no artigo:
“É este olhar imediato o que importa”, Garanger continua. “Quando se descarrega um condensador, uma centelha sai: para mim, a fotografia envolve apreensão só naquele instante de descarga. Nestas sessões, senti uma emoção completamente louca. Foi uma experiência avassaladora, com um raio em cada imagem. Eu levantei para o mundo um espelho, que reflectia esse olhar relâmpago que as mulheres lançaram contra mim.”
A autora do referido artigo justifica também a questão da humilhação perante as mulheres argelinas, referindo o seguinte no artigo:
“No Oriente Médio, o véu é como uma segunda pele entre os povos tradicionais. Pode ser retirado somente dentro do sigilo das paredes, entre mulheres ou entre marido e mulher, mas nunca publicamente. Os retratos de Garanger simbolizam a colisão de duas civilizações, a islâmica e a ocidental, e servem como uma metáfora para a colonização. O olhar desafiador das mulheres pode ser pensado como um “mau-olhado”, que se lançou para se protegerem e amaldiçoarem os seus inimigos.”
Marc Garanger regressou à Argélia em 2004 com a finalidade de revisitar algumas daquelas mulheres. 42 anos passados sobre a independência da Argélia, Garanger constatou que os seus retratos, tão contestados quatro décadas antes) eram em muitos casos os únicos retratos que estas pessoas tinham de elas mesmas. Garanger, que outrora tinha sido contestado por usar uma Câmera fotográfica como uma arma era agora bem-vindo a estas comunidades. O seu trabalho fotográfico, usado como forma de pressão e humilhação num país colonizado pelo Estado Francês tornaram-se, passado (agora) mais de meio século, os portadores da memória da luta Argelina pela independência.
Em Abril de 1989, viajou até ao Estado do Louisiana, nos EUA a convite da Kodak para testar o seu novo filme a cores Ektar. Este ensaio originou o “Lousisiana, Entre o Céu e a Terra”, em conjunto com o autor Yves Berger. Este livro documenta a fascinante Natureza do Lousisiana, bem como a sua população.
Convido agora os senhores Leitores a conhecer o Trabalho de Marc Garanger e a ler alguns artigos dos Media que foram escritos por altura das comemorações dos 50 anos da Independência da Argélia.
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